O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano V — Fevereiro de 1862.

(Idioma francês)

ENSINOS E DISSERTAÇÕES ESPÍRITAS.


Sobre os instintos.

(Sociedade Espírita de Paris.  †  – Médium: Sra. Costel.)
(Sumário)

Ensinar-te-ei o verdadeiro conhecimento do bem e do mal, que o espírito confunde com tanta frequência. O mal é a revolta dos instintos contra a consciência, esse tato interior e delicado, que é o tato moral. Quais os limites que o separam do bem, que ele contorna por toda parte? O mal não é complexo: é uno e emana do ser primitivo, que quer a satisfação do instinto à custa do dever. O instinto, primitivamente destinado a desenvolver no homem animal o cuidado de sua conservação e de seu bem-estar, é a única origem do mal, porque, persistindo mais violento e mais severo em certas naturezas, ele as impele a se apoderarem do que desejam ou a concentrar o que possuem. O instinto, a que os animais obedecem cegamente, e que é a sua própria virtude, deve ser incessantemente combatido pelo homem que quer elevar-se e substituir o grosseiro utensílio da necessidade pelas armas finamente buriladas da inteligência. Entretanto, haverás de convir que nem sempre o instinto é mau, devendo-lhe a Humanidade, não raras vezes, sublimes inspirações, como na maternidade e em certos atos de abnegação, nos quais substitui a reflexão com presteza e segurança. Minha filha, tua objeção é precisamente a causa do erro em que caem os homens, prontos a desconhecerem a verdade, sempre absoluta nas suas consequências. Sejam quais forem os resultados de uma causa má, os exemplos jamais devem levar a concluir contra as premissas estabelecidas pela razão. O instinto é mau porque é puramente humano e a Humanidade não deve pensar senão em se despojar, em deixar a carne para elevar-se ao Espírito. E se o mal caminha ao lado do bem, é que o seu princípio muitas vezes tem resultados opostos a si mesmo, e que o fazem desconhecer o homem leviano e arrastado pela sensação. Nada de verdadeiramente bom pode emanar do instinto: um impulso sublime não é devotamento, assim como uma inspiração isolada não é gênio. O verdadeiro progresso da Humanidade é sua luta e seu triunfo contra a essência mesma de seu ser. Jesus foi enviado à Terra para o provar humanamente. Pôs a descoberto a verdade, bela fonte escondida na areia da ignorância. Não perturbeis mais a limpidez da linfa divina pelos compostos do erro. E, crede, os homens que não são bons e devotados senão instintivamente, o são mal, porque sofrem uma cega dominação que, de repente, pode precipitá-los no abismo.


Lázaro.


Observação. – Apesar do nosso respeito pelo Espírito de Lázaro, que nos tem brindado com tantas e tão belas dissertações, permitimo-nos discordar de sua opinião no que concerne às últimas proposições. Pode-se dizer que há dois tipos de instinto: o instinto animal e o instinto moral. O primeiro, como diz muito bem Lázaro, é orgânico; é dado aos seres vivos para a sua conservação, bem como a de sua progênie; é cego e quase inconsciente, porque a Providência quis dar um contrapeso à sua indiferença e à sua negligência. Já não é assim com o instinto moral, que é privilégio do homem e que pode ser assim definido: Propensão inata para fazer o bem ou o mal. Ora, essa propensão se prende ao estado de maior ou menor avanço do Espírito. O homem, cujo Espírito já é depurado, faz o bem sem premeditação e como algo muito natural; daí por que se admira de ser louvado. Assim, não é justo dizer que “os homens que não são bons e devotados senão instintivamente, o são mal, porque sofrem uma cega dominação que, de repente, pode precipitá-los no abismo.” Os que instintivamente são bons e devotados denotam um progresso realizado; nos que o são intencionalmente, o progresso está por se realizar, razão por que há trabalho e luta entre os dois sentimentos. No primeiro, a dificuldade está vencida; no segundo, é preciso vencê-la. O primeiro é como o homem que sabe ler, e lê sem dificuldade, quase sem perceber; o segundo é como o que soletra. Porque um chegou mais tarde, terá menos mérito que o outro?


Allan Kardec.



Paris. — Typ. de Cosson et Ce rue du Four-St-Germain, 43.  † 


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