O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano I — Dezembro de 1858.

(Idioma francês)

Um Espírito nos funerais de seu corpo.

Estado da alma no momento da morte.
(Sumário)

1. — Os Espíritos sempre nos disseram que a separação da alma e do corpo não se dá instantaneamente; algumas vezes começa antes da morte real, durante a agonia; quando a última pulsação se faz sentir, o desprendimento ainda não se completou, operando-se mais ou menos lentamente, conforme as circunstâncias e, até sua completa liberação, experimenta uma perturbação, uma confusão que lhe não permitem dar-se conta de sua situação; encontra-se no estado de alguém que desperta e cujas ideias são confusas. Tal estado nada tem de penoso para o homem cuja consciência é pura; sem saber explicar bem o que vê, está calmo, esperando, sem temor, o completo despertar; é, ao contrário, cheio de angústia e de terror para quem teme o futuro. Dizemos que a duração dessa perturbação é variável; é bem menor nos que, durante a vida, já elevaram seus pensamentos e purificaram a alma, sendo suficientes dois ou três dias, enquanto a outros são necessários, por vezes, oito dias ou mais. Temos presenciado frequentemente esse momento solene e sempre vimos a mesma coisa; não é, pois, uma teoria, mas o resultado de observações, desde que é o Espírito quem fala e pinta a sua própria situação.


2. — Eis a seguir um exemplo muito mais característico e interessante para o observador, já que não se refere a um Espírito invisível escrevendo através de um médium, mas a um Espírito que é visto e ouvido na presença de seu corpo, seja na câmara mortuária, seja na igreja, durante o serviço fúnebre:

O Sr. X… acabava de ser acometido de um ataque de apoplexia; algumas horas depois de sua morte o Sr. Adrien, um de seus amigos, achava-se na câmara mortuária com a esposa do defunto; viu o Espírito deste, muito distintamente, caminhar em todos os sentidos, olhar alternadamente para seu corpo e para as pessoas presentes e, depois, assentar-se numa poltrona; tinha exatamente a mesma aparência que possuía em vida; vestia-se do mesmo modo: sobrecasaca e calça pretas; tinha as mãos no bolso e o ar preocupado.

Durante esse tempo sua mulher procurava um papel na secretária. Olhando-a, o marido disse: “Por mais que procures, nada encontrarás.” Ela nada suspeitava do que então se passava, pois o Sr. X… era visível apenas ao Sr. Adrien.


3. — No dia seguinte, durante o serviço fúnebre, o Sr. Adrien viu novamente o Espírito do amigo vagando ao lado do caixão, embora não mais portasse o costume da véspera; fazia-se envolver por uma espécie de túnica, estabelecendo-se entre ambos a seguinte conversa. Notemos, de passagem, que o Sr. Adrien absolutamente não é sonâmbulo e que nesse momento, tanto quanto no dia anterior, estava perfeitamente desperto e o Espírito lhe aparecia como se fosse um dos assistentes do enterro. [v. o artigo: Adrien, médium vidente.]


P. Dize-me uma coisa, meu caro Espírito: que sentes agora?

Resposta. – Bem e sofrimento.


P. Não compreendo isso.

Resposta. – Sinto que estou vivendo minha verdadeira vida e, no entanto, vejo meu corpo aqui neste caixão; apalpo-me e não me percebo, contudo, sinto que vivo, que existo. Sou, pois, dois seres? Ah! Deixai-me sair desta noite: tenho pesadelo.


P. Permanecerás por muito tempo assim?

Resposta. – Oh! Não; graças a Deus, meu amigo; sinto que logo despertarei. De outro modo seria horrível; tenho as ideias confusas; tudo é nevoeiro; sonho na grande divisão que acaba de ser feita… e da qual ainda nada compreendo.


P. Que efeito vos produziu a morte?

Resposta. – A morte! Não estou morto, meu filho; tu te enganas. Levantava e, de repente, fui tomado por uma escuridão que me desceu sobre os olhos; depois me ergui: julga o meu espanto ao me ver e me sentir vivo, percebendo, ao lado, sobre a laje, meu outro ego deitado. Minhas ideias eram confusas; errei para me refazer, mas não pude; vi chegar minha esposa, velar-me, lamentar-se, e me perguntei: Por quê? Consolei-a, falei-lhe, mas não respondia nem me compreendia; foi isso que me torturou, deixando-me o Espírito ainda mais perturbado. Somente tu me fizeste o bem, porque me ouviste e compreendes o que quero; tu me auxilias a pôr em ordem minhas ideias e me fazes um grande bem; mas por que os outros não fazem o mesmo? Eis o que me tortura… O cérebro está esmagado em face dessa dor… Irei vê-la; quem sabe ela me entenda agora… Até logo, caro amigo; chama-me e irei ver-te… Far-te-ei uma visita de amigo… Surpreender-te-ei… Até logo.


4. — A seguir o Sr. Adrien o viu aproximar-se do filho, que chorava. Curvou-se sobre ele, permaneceu alguns instantes nessa posição e, depois, partiu rapidamente. Não havia sido entendido, mas imaginava, por certo, ter produzido um som. Quanto ao Sr. Adrien, estava persuadido de que aquilo que dizia o Sr. X… chegava até o coração do filho, comprometendo-se a prová-lo. Mais tarde viu o rapaz: estava mais calmo.


Observação. – Esta narração concorda com tudo aquilo que havíamos observado sobre o fenômeno da separação da alma; confirma, em circunstâncias bastante especiais, essa verdade: após a morte o Espírito ainda está ali presente. Enquanto todos acreditam ter diante de si um corpo inerte, ele vê e escuta tudo quanto se passa à sua volta, penetra o pensamento dos assistentes e sabe que, entre si e estes últimos, a única diferença que existe é a visibilidade e a invisibilidade; as lágrimas hipócritas dos ávidos herdeiros não o enganam. Quantas decepções devem os Espíritos experimentar nesse momento!


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